Sangar

Sangar, o terceiro juiz de Israel, foi levantado por Deus para libertar o povo da opressão dos Filisteus. A Bíblia relata que ele matou mais de 600 soldados inimigos com uma aguilha de conduzir bois.

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13 minutos de leitura

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Sangar foi o terceiro juiz levantado por Deus para livrar o povo de Israel. Ele impediu o avanço filisteu sobre as terras israelitas. Ele é reconhecido como um homem valente e muito forte, que com apenas uma aguilha de conduzir bois conseguiu derrotar seus inimigos.

Sua descrição no texto bíblico é breve, porém sua história, local de nascimento, paternidade e diversos outros detalhes de sua vida, são vastamente debatidos entre os historiadores.

Neste artigo apresentamos um pouco de sua vida, destacando seus feitos e controvérsias.


Nascimento e família de Sangar

Sangar possui uma origem camponesa, tendo provavelmente vivido na região da Sefelá, próximo a terra dos filisteus. A Bíblia não é clara quanto ao seu local de nascimento, ou mesmo a qual tribo pertenceu, sendo possível seja membro da tribo de Dã, Simeão ou Judá.

Alguns sugerem que Sangar, assim como o juiz Sansão, fosse da tribo de Dã, por ser uma tribo que se desenvolver muito próxima do povo filisteu. Apesar de ser uma possibilidade, não é possível dizer com certeza.

A Bíblia não é clara sobre quando ele atuou como juiz em Israel. Há estudiosos que atribuem seu tempo de atuação nos últimos anos de vida do juiz Eúde, enquanto outros defendem que ele atuou no mesmo período da juíza Débora.

Caso ele tenha sido contemporâneo de Débora, podemos supor que ele viveu entre os anos 1250 3 1190 a.C.

A Bíblia não muitas informações sobre sua família, além de sua paternidade. É possível que ele fosse casado e tenha gerado filhos, porém o texto bíblico não os descreve.

Juiz Sangar
Juiz Sangar lutando contra os filisteus

Anate, pai de Sangar

Anate possui apenas uma menção no texto bíblico, sendo descrito como pai do terceiro juiz de Israel. Pelo contexto em que ele é citado, podemos supor que ele possuía uma origem no campo, tendo trabalhado na agricultura como grande parte dos homens ao sul de Israel.

Há uma grande controvérsia entre os estudiosos do período dos juízes se Anate de fato existiu. Se essa expressão “filho de Anate” se refere a um homem chamado Anate, ou a uma cidade cananeia ou mesmo a uma deusa pagã de nome semelhante, Anat.


História de Sangar

Por volta de 1500 a.C., próximo do período em que Israel conquistou a Terra Prometida, o povo filisteu migrou da região do Mar Egeu para a costa sul de Canaã.

Alguns historiadores sugerem que o relato de Juízes 3:31, datado para aproximadamente 1250 a.C., descreve a primeira tentativa dos filisteus expandirem seu território sobre as terras israelitas.

Essa tentativa de invasão teria levado a diversos conflitos locais, com as tribos ao sul de Israel (Dã, Simeão e Judá).

Filisteus contra os israelitas
Filisteus contra os israelitas

Deus levanta Sangar para libertar seu povo

O relato bíblico nos sugere que Sangar, um camponês da região, foi levantado por Deus para liderar uma pequena resistência e atacar os invasores filisteus.

O fato dele utilizar uma “aguilha de boi” nos leva a crer que, além dele ser possivelmente de origem camponesa, os habitantes da região estavam extremamente mal equipados para uma batalha. Em contrate, o povo filisteu era conhecido pelo trabalho na metalurgia e confecção de espadas e escudos de ferro de alta qualidade.

Vitória de Sangar

Mesmo diante da improbabilidade de vitória, Deus usa Sangar “que matou seiscentos filisteus com uma aguilhada de bois” (Jz 3:31, NVI).

A aguilha de bois é uma ferramenta, geralmente com o corpo feito de madeira, com uma ponta de ferro pontiaguda que era utilizada pelos povos antigos para guiar gado, ou rebanho, pelas montanhas e vales, sempre em direção a novas pastagens.

Com a derrota, os filisteus foram forçados a voltar para suas cidades. Com o tempo, eles estabeleceram um reino de guerreiro na região da Baixa Sefelá, em direção a costa sul do mar Mediterrâneo. Essa derrota trouxe um grande período de relativa paz entre os dois povos.

Apenas anos depois, no tempo do juiz Sansão, os filisteus tentariam invadir as terras israelitas novamente.

Sangar - atacando os filisteus
Sangar atacando os filisteus. Iluminura no Speculum humanae salvationis.

Controvérsias sobre a paternidade de Sangar e sua região de nascimento

A expressão “filho de Anate” utilizada em Juízes 3:31 ao apresentar o juiz Sangar, gerou intensos debates entre estudiosos do Antigo Testamento. Muitos estudiosos creem que essa expressão não diz respeito ao pai do juiz, mas sim uma marcação de sua origem.

Diversas hipóteses foram levantadas para descrever essa expressão. Aqui querermos apresentar as duas principais e nossa visão com base em nossa análise das Escrituras.

Hipótese geográfica

Alguns estudiosos acreditam que “Anate” não se refere ao pai de Sangar, mas sim à sua cidade natal, Bete-Anate na na tribo de Naftali.

Bete-Anate, ou apenas Anate, foi uma antiga cidade ao norte de Canaã no vale de Jezreel. Esta cidade foi umas das poucas que não foram conquistadas pelos israelitas durante a tomada da Terra Prometida.

Segundo esta visão, o terceiro juiz de Israel seria de origem estrangeira. Não apenas estrangeira, como também pagã, visto que as cidades cananeias da região adoram deuses locais, como Aserá e Baal.

Dessa forma, Deus teria levantado um homem estrangeiro para libertar seu povo.

Cidade de Bete-Anate
Cidade de Bete-Anate

Nem Naftali expulsou os que viviam em Bete-Semes e em Bete-Anate; portanto, o povo de Naftali também vivia entre os cananeus que habitavam a terra, e aqueles que viviam em Bete-Semes e em Bete-Anate passaram a fazer trabalhos forçados para eles.

Juízes 1:33 (NVI)

Hipótese religiosa

Outra hipótese levantada é que a expressão “filho de Anate” seria um título de guerra. Na época era comum as pessoas utilizarem títulos de guerra para honrar seus deuses, como uma forma de atribuir suas vitórias a uma divindade que teoricamente estaria o abençoando e concedendo vitórias.

Anate, ou mesmo Anat, era o nome de uma deusa cananeia associada a guerra. Para os estudiosos que defendem essa visão, esse título “filho de Anate” foi atribuído a Sangar pelos cananeus e israelitas idólatras de seu tempo. Como se o juiz fosse o “campeão” enviado para Canaã, pela deusa Anate, para libertar os povos locais do domínio filisteu.

Essa visão, além de controvérsia, levanta diversos questionamentos teológicos sobre a espiritualidade dos israelitas do período dos Juízes.

Análise bíblica e visão da equipe do Teológico

Compreendemos que ambas as hipóteses possuem pouco fundamento bíblico. É pouco provável que Deus usaria alguém de um povo pagão para libertar Israel, ou que a Bíblia atribuiria a um herói de Israel um título de guerra de uma deusa pagã.

Ao nosso ver, essa hipóteses são uma maneira de problematizar ou tornar complexo algo que nada verdade é bem simples e claro. A nenhum outro juiz de Israel é levantado uma controvérsia como essa sobre a paternidade e uso da expressão “filho de”.

Tolá e Eúde, os dois primeiros juízes descritos na Bíblia, possuem associações semelhantes:

  • “Depois de Abimeleque, um homem de Issacar chamado Tolá, filho de Puá, filho de Dodô […]” em Juízes 10:1;
  • “[…] e o Senhor lhes levantou um libertador: Eúde, filho de Gera, benjamita, homem canhoto. […]” em Juízes 3:15.

A interpretação mais simples e consistente, em nossa visão, é a de que Anate, de fato, é o nome do pai de Sangar.


Contradição sobre o período em que Sangar foi juiz

O livro de Juízes apresenta uma aparente contradição a respeito do período em que Sangar atuou como juiz em Israel. O texto de Juízes 3:31 nos diz que Sangar sucedeu Eúde, enquanto a narrativa de Juízes 4 nos apresenta Débora, como a juíza levantada por Deus após a morte de Eúde.

Para explicar essa apenas aparente contradição, estudiosos têm debatido três hipóteses principais. Abaixo apresentamos as principais hipóteses juntamente de seus principais defensores.

Sangar e Eúde foram contemporâneos

Eusébio de Cesareia acreditava que Sangar e Eúde foram juízes no mesmo período, com cada um libertando o povo em uma região diferente. [3]

Segundo Eusébio, Deus usou Eúde para libertar as tribos mais a leste, próximas do Rio Jordão e da região de Gileade, próximo a terra dos moabitas. Enquanto Sangar foi usado para libertar as tribos a oeste, próximas da Sefelá e dos filisteus.

Nesta visão, o texto bíblico não errou ao afirmar que Débora se tornou juíza após a morte de Eúde. A descrição de Juízes capítulo 4 apenas não mencionou que Sangar também antecedeu Débora, provavelmente porque ele não teve tanta relevância e uma atuação tão importante como Eúde.

Apesar de parecer coerente, há poucas evidências bíblicas que confirmem essa teoria,

Eúde mata Eglom
Ilustração de Eúde matando Eglom

Sangar e Débora foram contemporâneos

Similar a Eusébio, Adam Clarke defende que Sangar atuou como juiz no mesmo período de Débora, e não Eúde. Ele atuando na região de Judá e Dã, e Débora na região de Efraim e norte de Israel [4].

A principal base bíblica para esta afirmação se encontra em Juízes 5:6, que diz:

⁶ Nos dias de Sangar, filho de Anate, nos dias de Jael, as estradas estavam desertas; os que viajavam seguiam caminhos tortuosos.
⁷ Já tinham desistido os camponeses de Israel, já tinham desistido, até que eu, Débora, me levantei; levantou-se uma mãe em Israel.

Juízes 5:6,7 (NVI)

Para Clarke, uma vez que Jael foi contemporânea de Débora, estando inserida no relato da perseguição e morte de Sísera, e este trecho bíblico sugere que ela e Sangar viveram no mesmo período, ele conclui que ambos os juízes atuaram no mesmo período.

Sucessão direta de Débora

John Gill, por sua vez, segue uma linha muito distinta dos teólogos anteriores.

Para ele, a menção a Sangar no livro de Juízes é breve e difícil de se localizar no tempo, porque seu período de atuação foi muito curto, com uma ou algumas batalhas que resultaram em uma vitória militar breve e que não levou a uma restauração espiritual de seu povo, como foi com Otniel, Eúde e Débora. [5]

Outros pensadores que seguem esta linha de pensamento, colocam a atuação de Sangar como juiz, em um período muito curto entre a morte de Eúde e a atuação de Débora. Provavelmente alguns anos antes de Jabim, de Hazor, invadir as tribos do norte.

Jael, Débora e Baraque (c. 1630) por Salomon de Bray
Jael, Débora e Baraque (c. 1630) por Salomon de Bray

Morte de Sangar

A Bíblia não relata a morte do juiz Sangar, seja seu local ou período. Entretanto, acreditam que ele tenha vivido todo o período de dominação cananita, de Jabim II e Sísera, até poucos anos após a vitória de Débora e Baraque.

Essa crença se dá por conta do Cântico de Débora registrado em Juízes 5.

“Nos dias de Sangar, filho de Anate, nos dias de Jael, as estradas estavam desertas; os que viajavam seguiam caminhos tortuosos”

Juízes 5:6 (NVI)

Legado de Sangar

Apesar de ser o juiz com o menor relato do texto bíblico, Sangar inspirou o nome de um personagem no livro “A Máquina de Pintar Nuvens” de Fernando Veríssimo. Este personagem não possui nenhuma relação com a história bíblica ou mesmo as características do juiz israelitas, apenas a inspiração do nome.


Comparação dos juízes Sangar e Sansão

Alguns comparam, e até confundem, o juiz Sangar com Sansão. Essa confusão se dá, porque ambos combateram os filisteus e foram juízes guerreiros.

Aqui apresentamos uma tabela comparando a vida e atuação de cada um dos juízes.

AspectoSangarSansão
TriboIncerta, talvez a tribo de DãTribo de Dã
OrigemIncerta, provavelmente camponêsFamília simples, provavelmente de origem camponesa
MotivaçõesCombateu os inimigos de seu povoCombateu os inimigos de seu povo
Conflito PrincipalLutou contra os filisteus, matando 600 inimigosLutou contra os filisteus, matou milhares inimigos
DesfechoNão registradoMorreu após matar muitos os inimigos

Significado de Sangar

O nome Sangar vem do hebraico Shamgar (שמגר), e o significado mais provável de seu nome é “espada” [2]. Algumas traduções da Bíblia utilizam o nome Samgar.


Aprenda mais

[Podcast] Quem foram os juízes?. Btcast.

[Vídeo] Juízes. Bible Project – Português.

[Vídeo] Sangar (O juiz guerreiro que se pareceu com Sansão). Testemunhando Jesus Cristo.

[Vídeo] SANGAR: História e Lições do Juiz que libertou Israel com uma aguilhada de bois. Biblioteca do Pregador.


Perguntas comuns

Nesta seção apresentamos as principais perguntas, com as respostas, que as pessoas fazem sobre este importante personagem bíblico.

Onde a Bíblia fala de Sangar?

O relato do juiz Sangar se encontra em Juízes 3:31.

Quanto tempo Sangar julgou Israel?

A Bíblia não fala por quanto tempo Sangar julgou sobre Israel. Ele é o juiz menos mencionado em todo o texto bíblico, o que se sabe a seu respeito é que guerreou contra os filisteus, matando 600 homens com uma aguilha de boi, e que foi contemporâneo da juíza Débora.

O que aprendemos com a história de Sangar?

Aprendemos que Deus nos uso apesar das ferramentas, humanamente falamos, que possuímos. O juiz foi capaz de derrotar 600 filisteus com apenas uma aguilha de boi, uma ferramenta comum do campo.

Outras lição que tiramos é que Deus usa as pessoas mais improváveis para realizar feitos grandiosos. O juiz era um simples camponês, que talvez jamais tinha pegado em uma espada, mas mesmo assim foi usado por Deus. Além de derrotar o inimigo ele livrou seu povo de um grande ataque e foi reconhecido por isso.

Qual era a tribo de Sangar?

A Bíblia não registra qual era a tribo de Sangar. Entretanto, o mais provável é que ele pertencesse a uma tribo sul de Israel, próxima a terra dos filisteus. As mais prováveis são Dã, Simeão e Judá.

O que é uma aguilhada de bois?

Uma aguilha de bois, ou uma aguilha de guiar bois, era um instrumentos utilizado na Antiguidade na pecuária. Ele servia para guiar o gado, os bois que estavam.

A aguilhada é um implemento agrícola tradicional, usado para esporear ou guiar o gado, geralmente bois, que puxam um arado ou uma carroça; usado também para cercar o gado.


Fontes

[1] Qual o significado do nome e quem foi Anate na Bíblia? Apologeta

[2] Quem foi Sangar na Bíblia? – Apologeta

[3] Eusébio de Cesareia, Crônica, A Crônica hebraica, 32. Do livro de Juízes

[4] Adam Clarke, Commentary on the Bible (1831), Judges, Chapter 4

[5] John Gill, Exposition of the Old and New Testament (1746-63), Judges, Chapter 4

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Diego Pereira do Nascimento
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