Pecado Original

O Pecado Original é a condição pecaminosa da humanidade, resultado da desobediência de Adão e Eva, que corrompeu nossa natureza.

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O Pecado Original é uma doutrina teológica que afirma a condição pecaminosa da humanidade resultante da primeira desobediência de Adão e Eva a Deus no Jardim do Éden [1].

Essa doutrina sustenta que o pecado de Adão não afetou apenas a si mesmo, mas também transmitiu uma natureza corrompida a toda a sua descendência. Assim, cada ser humano nasce em um estado de depravação, inclinado ao mal e separado da comunhão perfeita com o Criador.

Neste artigo apresentamos a definição e as consequências do Pecado Original na humanidade.

Origens e natureza do Pecado Original

A compreensão do Pecado Original tem suas raízes nos textos do Antigo Testamento, especialmente no relato da Queda, e é amplamente desenvolvida no Novo Testamento. Ele explica a universalidade do pecado e a necessidade da redenção divina.

A Queda no Jardim do Éden

A narrativa de Gênesis 3 descreve a desobediência de Adão e Eva ao comerem do fruto da árvore do conhecimento do bem e do mal [2]. Este ato não foi meramente uma transgressão de uma regra, mas uma rebelião contra a soberania de Deus.

Ao buscar conhecimento e autonomia fora dos limites divinos, eles romperam a perfeita relação com seu Criador.

A consequência imediata foi a perda da inocência e a introdução da morte e do sofrimento no mundo.

Deus havia advertido que o comer do fruto resultaria em morte, e essa morte abrangeu tanto o aspecto físico quanto o espiritual. A comunhão direta com Deus foi quebrada, e a existência humana foi alterada [2].

A desobediência de Adão, como cabeça representativa da humanidade, teve efeitos profundos.

Sua escolha afetou não apenas sua própria condição, mas também o estado de todos os seus descendentes. Isso introduziu uma mancha moral e espiritual que se manifesta na inclinação natural para o pecado.

Expulsão de Adão e Eva (Alexandre Cabanel)
Expulsão de Adão e Eva (Alexandre Cabanel)

A transmissão do Pecado

A doutrina do Pecado Original ensina que a natureza pecaminosa de Adão foi herdada por toda a humanidade. Paulo, em Romanos 5:12, declara que:

“assim como por um só homem entrou o pecado no mundo, e pelo pecado a morte, assim também a morte se estendeu a todos os homens, porque todos pecaram”

Romanos 5:12-21

A transmissão não significa que cada pessoa é culpada pelo pecado de Adão. Em vez disso, implica que todos nascem com uma natureza pecaminosa, uma propensão ao pecado. Esta propensão é inerente à condição humana desde o nascimento, manifestando-se em atos de desobediência e egoísmo.

Este estado de pecaminosidade é frequentemente referido como depravação. A depravação não significa que os seres humanos são tão maus quanto podem ser, mas que todas as faculdades humanas – intelecto, emoções, vontade – foram afetadas e corrompidas pelo pecado.

Doutrinas do Pecado Original

Dentro do protestantismo, existem nuances na compreensão do Pecado Original, embora a base de sua existência e transmissão seja amplamente aceita. As principais vertentes teológicas oferecem perspectivas importantes sobre essa doutrina.

Visão reformada (Calvinista)

A teologia reformada, associada a João Calvino, enfatiza a doutrina da Corrupção Total como um aspecto central do Pecado Original. Esta visão afirma que, após a Queda, todas as partes da natureza humana foram corrompidas pelo pecado [4].

O intelecto, a vontade, as emoções e o corpo estão todos sob a influência do pecado.

A Corrupção Total não significa que o homem é incapaz de fazer algo bom em termos civis ou morais, mas que ele é incapaz de buscar a Deus verdadeiramente.

Sua vontade está escravizada ao pecado e ele não pode, por si mesmo, escolher o que é espiritualmente bom ou salvar-se [4]. A regeneração pelo Espírito Santo é, portanto, indispensável.

Retrato de João Calvino de 1550
Retrato de João Calvino de 1550

Visão luterana

Martinho Lutero e a tradição luterana também sustentam uma forte visão do Pecado Original, definindo-o como a total falta de fé e confiança em Deus [5]. Para Lutero, o pecado não é apenas a prática de atos errados, mas uma condição intrínseca da natureza humana.

Ele via o Pecado Original como uma doença que afeta a substância do ser humano, tornando-o totalmente avesso a Deus. Essa condição resulta na incapacidade de cumprir a lei divina ou de merecer a salvação. A justificação pela fé somente é a resposta para essa condição, através da graça de Deus em Cristo [5].

Visão arminiana

A teologia arminiana, desenvolvida por Jacó Armínio, concorda que o Pecado Original resultou na corrupção da natureza humana [6].

No entanto, ela difere na extensão dessa corrupção e na capacidade da vontade humana.

Os arminianos acreditam que, embora o pecado tenha enfraquecido e corrompido a vontade, a graça preveniente de Deus restaura a capacidade humana de responder ao Evangelho.

Essa graça preveniente permite que o indivíduo coopere com Deus na salvação, ou seja, que ele possa escolher crer em Cristo [6].

Portanto, a depravação não é total a ponto de anular completamente a responsabilidade humana de aceitar ou rejeitar a oferta divina de redenção.

Jacó Armínio por David Bailly, 1620
Jacó Armínio por David Bailly, 1620

Implicações teológicas do Pecado Original

As implicações do Pecado Original são vastas, afetando a compreensão da natureza humana, da salvação e da obra de Cristo. Essa doutrina fornece uma moldura para entender a necessidade da intervenção divina.

Corrupção total

O Pecado Original estabelece que a humanidade, por sua própria natureza, é incapaz de alcançar a retidão ou de agradar a Deus por seus próprios méritos.

A corrupção afeta a totalidade do ser humano, tornando-o inclinado ao pecado desde o nascimento [7]. Salmo 51:5 expressa essa condição: “Eis que em iniquidade fui formado, e em pecado me concebeu minha mãe”.

Essa verdade ressalta a seriedade do pecado e a distância entre a humanidade e um Deus santo. Sem uma intervenção divina, a raça humana estaria eternamente perdida em sua condição pecaminosa.

Ilustração de Adão e Eva segurando o Fruto Proibido (Pecado Original)
Ilustração de Adão e Eva segurando o Fruto Proibido (Pecado Original)

Necessidade da graça de Deus

Com a incapacidade humana de se redimir, a graça de Deus torna-se o único caminho para a salvação. O Pecado Original sublinha que a redenção não é resultado do esforço humano, mas um dom imerecido de Deus [8].

“Porque pela graça sois salvos, por meio da fé; e isto não vem de vós, é dom de Deus. Não vem das obras, para que ninguém se glorie.”

Efésios 2:8-9

A obra expiatória de Jesus Cristo na cruz é a solução divina para o problema do pecado. Sua morte e ressurreição superam o poder do pecado e da morte, oferecendo perdão e reconciliação com Deus para aqueles que creem.

Impacto na vida humana

O Pecado Original tem um impacto profundo na experiência humana diária. Ele explica a presença do mal, do sofrimento e da morte no mundo [9]. As lutas morais internas, a tendência ao egoísmo e a dificuldade em fazer o que é certo são manifestações dessa natureza caída.

Essa doutrina também molda a visão de mundo cristã, fornecendo uma base para a ética e a moralidade. Reconhecer a natureza pecaminosa humana encoraja a humildade e a dependência de Deus em todas as áreas da vida.

História do Pecado Original

Diversas passagens bíblicas fornecem a base para a doutrina do Pecado Original, ilustrando sua origem e suas consequências. Estes textos são fundamentais para a teologia cristã.

Gênesis 3

O relato da Queda em Gênesis 3 é a fonte primária da doutrina [2]. A desobediência de Adão e Eva levou à perda da inocência, à entrada do pecado e da morte no mundo, e à expulsão do Éden.

Esta passagem descreve como a relação harmoniosa entre Deus e a humanidade foi quebrada.

As consequências descritas em Gênesis 3 não se limitam apenas ao primeiro casal, mas se estendem à serpente, à mulher, ao homem e à própria terra. Isso sugere um impacto universal da transgressão.

Personagens Bíblicos: Adão e Eva. Adão e Eva no Jardim do Éden por Johann Wenzel Peter
Adão e Eva no Jardim do Éden por Johann Wenzel Peter

Romanos 5:12-21

Paulo, em Romanos 5:12, compara Adão a Cristo, apresentando Adão como o “primeiro homem” por quem o pecado e a morte entraram no mundo [3]. Ele argumenta que “por meio da desobediência de um só homem muitos foram feitos pecadores” (Romanos 5:19). Esta passagem é crucial para entender a transmissão do pecado.

Em contraste, Cristo é apresentado como o “segundo Adão”, cuja obediência trouxe a justificação e a vida para muitos [3]. A obra de Cristo anula e reverte os efeitos do Pecado Original, oferecendo a graça superabundante de Deus.

Salmo 51:5

Este versículo, “Eis que em iniquidade fui formado, e em pecado me concebeu minha mãe”, é frequentemente citado para apoiar a ideia de que a natureza pecaminosa é inerente desde o nascimento [7]. Embora possa ser interpretado de diversas formas, na teologia protestante, ele aponta para uma condição de pecaminosidade presente desde a concepção.

O Salmo 51, um salmo de arrependimento de Davi, reflete uma profunda consciência da pecaminosidade inata, que vai além dos atos específicos de pecado.

Comparação com Outras Perspectivas Cristãs

Embora o foco deste artigo seja a perspectiva protestante, é útil notar como outras tradições cristãs entendem o Pecado Original, pois isso realça as particularidades da visão protestante.

Perspectiva Ortodoxa Oriental

A Igreja Ortodoxa Oriental reconhece a Queda e suas consequências, mas tende a evitar o termo “Pecado Original” no mesmo sentido ocidental [10]. Eles preferem falar em “pecado ancestral” ou “ancestralidade do pecado”.

A Queda introduziu a mortalidade e a inclinação para o pecado, mas não a culpa de Adão transmitida a todos.

A Ortodoxia enfatiza que, enquanto o pecado de Adão resultou na herança de uma natureza corrompida e na mortalidade, cada pessoa é responsável apenas pelos seus próprios pecados [10].

A humanidade herda a doença espiritual e a inclinação, mas não a culpa imputada do pecado de Adão.

Ícone copta de Jesus Cristo alimentando uma multidão. (Igreja Católica Ortodoxa Oriental)
Ícone copta de Jesus Cristo alimentando uma multidão

Perspectiva Católica Romana

A Igreja Católica Romana defende a doutrina do Pecado Original, ensinando que ele é transmitido por propagação e não por imitação [11]. Para os católicos, o Pecado Original não é um pecado pessoal no sentido de um ato voluntário, mas uma “privação da santidade e da justiça originais”.

Eles ensinam que o Pecado Original é removido pelo batismo, que confere a graça santificante e apaga a mancha do pecado. No entanto, a concupiscência (a inclinação para o pecado) permanece, e a luta contra ela continua ao longo da vida [11].

Aprenda mais

[Vídeo] Teológico | Bíblia & Teologia.

[Vídeo] O Pecado Original (Rm 5.12-14). Augustus Nicodemus.

Perguntas comuns

Nesta seção apresentamos as principais perguntas, com suas respectivas respostas, acerca da doutrina do Pecado Original.

Qual era o pecado original?

Foi o ato de desobediência de Adão e Eva ao comerem o fruto proibido, desafiando a ordem de Deus. Representou uma rebelião contra a autoridade divina e o desejo de serem como Deus, definindo o bem e o mal por si mesmos, resultando na Queda da humanidade.

O que significa pecado no original?

No hebraico (chatá) e no grego (hamartia), a principal palavra para pecado significa “errar o alvo”. A imagem é a de um arqueiro que não acerta o centro, que seria o padrão perfeito de Deus. Pecado é, portanto, qualquer desvio da vontade e da santidade de Deus.

Por que Jesus não herdou o pecado original?

A teologia cristã ensina que Jesus não herdou o pecado original devido à Sua concepção virginal pelo Espírito Santo. Como Ele não teve um pai humano, a linhagem de pecado transmitida desde Adão foi interrompida, permitindo que Ele nascesse sem uma natureza pecaminosa para ser o Salvador perfeito.

Porque Maria nasceu sem o pecado original?

A perspectiva protestante ensina que Maria, embora grandemente abençoada, nasceu com a natureza pecaminosa herdada de Adão, como todos os humanos. A crença de que ela nasceu sem pecado (Imaculada Conceição) é uma doutrina da Igreja Católica, não sendo encontrada ou aceita pelas igrejas protestantes.

Fontes

[1] Hoekema, Anthony A. Created in God’s Image. Grand Rapids, MI: Eerdmans, 1986.

[2] Gênesis 3:1-24. Bíblia Sagrada.

[3] Romanos 5:12-21. Bíblia Sagrada.

[4] Sproul, R. C. Essential Truths of the Christian Faith. Wheaton, IL: Tyndale House Publishers, 1992.

Demais fontes

[5] Luther, Martin. The Bondage of the Will. Traduzido por J. I. Packer e O. R. Johnston. Grand Rapids, MI: Revell, 1957.

[6] Arminius, Jacob. The Works of James Arminius, Vol. 1. Traduzido por James Nichols. Grand Rapids, MI: Baker Book House, 1956.

[7] Salmo 51:5. Bíblia Sagrada.

[8] Efésios 2:8-9. Bíblia Sagrada.

[9] Berkhof, Louis. Systematic Theology. Grand Rapids, MI: Eerdmans, 1932.

[10] Ware, Kallistos. The Orthodox Church. Nova York: Penguin Books, 1993.

[11] Catechism of the Catholic Church, paragraphs 402-406. Vaticano: Libreria Editrice Vaticana, 1993.

[12] Augustine of Hippo. On Marriage and Concupiscence. Nicene and Post-Nicene Fathers, First Series, Vol. 5. Editado por Philip Schaff. Buffalo, NY: Christian Literature Publishing Co., 1887.

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Diego Pereira do Nascimento
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