O josefismo, também conhecido como josefinismo, foi um movimento e uma teoria política e religiosa implementada durante o reinado de José II, Sacro Imperador Romano-Germânico.
Essa doutrina marcou uma transformação nas relações entre a Igreja Católica e o Estado nos territórios controlados pelos Habsburgos, promovendo a subordinação da Igreja às autoridades seculares.
Neste artigo apresentamos a história deste movimento, seus princípios e as críticas levantadas sobre ele.
História do josefismo
O josefismo surgiu no contexto do Iluminismo, período marcado pelo fortalecimento das ideias de racionalidade, secularismo, centralização do poder e reforma das instituições tradicionais na Europa do século XVIII.
Esse movimento intelectual valorizava a razão como fundamento para a organização social e política, promovendo o espírito crítico e a busca pelo progresso, ao mesmo tempo em que desafiava tradições religiosas, estruturas feudais e a autoridade absoluta da Igreja.
Nesse ambiente de transformações, José II, imperador do Sacro Império Romano-Germânico e soberano da dinastia Habsburgo, procurou aplicar os princípios iluministas à administração do Estado.
Seu objetivo era modernizar o Império Habsburgo, racionalizando suas estruturas e consolidando o poder estatal.
Para isso, José II promoveu uma série de reformas que incluíam maior tolerância religiosa, reorganização do sistema judiciário, centralização administrativa e, especialmente, a limitação da influência da Igreja Católica em assuntos civis e políticos.
Nesse contexto, o josefismo tornou-se uma política de subordinação da Igreja ao Estado, reduzindo o poder do clero, fechando conventos considerados improdutivos, reformando a educação religiosa e exigindo que todas as decisões eclesiásticas passassem pelo controle estatal.
A autoridade papal foi significativamente restringida, e o imperador passou a se ver como o principal regulador da vida religiosa dentro de suas fronteiras. [1]

Influências do iluminismo
Influenciado por pensadores iluministas como Voltaire, que defendia a tolerância religiosa, e Montesquieu, que propunha a separação de poderes, José II enxergava o Estado como o principal agente de progresso.
Ele acreditava que a centralização do poder e a secularização das instituições eram essenciais para fortalecer a monarquia e promover o bem-estar da população. Suas reformas, conhecidas como “reformas josefinas”, abrangiam administração, educação, legislação e o papel da Igreja, com o objetivo de racionalizar e modernizar o governo. [2]
Influências do galicanismo
O galicanismo, com sua ênfase na autonomia da Igreja francesa frente ao papado, influenciou profundamente o josefismo de José II.
O galicanismo inspirou José II a limitar o poder da Igreja Católica, promovendo um Estado secular. Suas reformas, como a dissolução de mosteiros contemplativos e a nacionalização de bens eclesiásticos, refletem a ideia de controle estatal (Poder Civil) sobre a Igreja Católica do galicanismo. [9]
A tolerância religiosa josefina, alinhada ao espírito iluminista, reflete princípios protestantes de liberdade de consciência, embora adaptados a um contexto católico. [11]
Influências do jansenismo
Assim como o galicanismo, o jansenismo influenciou o imperador José II a questionar a autoridade do papa sobre a Igreja Católica.
Suas reformas, como a supressão de ordens religiosas contemplativas e a secularização de bens eclesiásticos [11], refletem o espírito jansenista de simplificação e controle estatal sobre a Igreja.
Além disso, a promoção da educação pelo Estado, e não mais pela Igreja Católica, e da tolerância religiosa pelo josefismo ecoa o apelo jansenista por uma fé mais racional e menos clerical. [17]
Podemos dizer que o jansenismo forneceu um modelo para o José II fortalecer sua visão de um Estado laico e centralizado no poder civil.

As reformas josefinas
As reformas de José II, implementadas principalmente na Áustria, Boêmia, Hungria e outras regiões sob domínio dos Habsburgos, buscavam redefinir a relação entre Igreja e Estado, além de promover mudanças estruturais na sociedade.
Entre as principais medidas, se destacam:
- Édito de Tolerância;
- Secularização de propriedades eclesiásticas;
- Controle estatal sobre a Igreja;
- Reformas na educação e administração.
Édito de Tolerância
O Édito de Tolerância foi uma das reformas mais emblemáticas de José II. Ele garantiu liberdade religiosa limitada a protestantes e cristãos ortodoxos, permitindo-lhes praticar sua fé publicamente e ocupar cargos públicos, algo até então restrito aos católicos.
Essa medida desafiava a exclusividade da Igreja Católica, que historicamente dominava a vida religiosa e política nos territórios dos Habsburgos. [3]

Secularização de propriedades eclesiásticas
José II suprimiu mosteiros considerados “improdutivos” (aqueles sem funções sociais, como ensino ou assistência), secularizando suas propriedades.
Os recursos confiscados foram redirecionados para financiar a criação de escolas, hospitais e outras instituições estatais, alinhando-se à visão iluminista de utilidade pública. Essa medida gerou forte oposição do clero, que via suas propriedades e influência reduzidas. [4]
Controle estatal sobre a Igreja
Por meio de decretos como a Patente de 1783, José II transferiu o controle de nomeações eclesiásticas do papa para o imperador, limitando a autoridade do Vaticano nos territórios dos Habsburgos.
Ele também aboliu isenções e privilégios papais que, segundo ele, comprometiam a soberania do monarca. Essas ações reforçaram a ideia de que a Igreja deveria estar subordinada aos interesses do Estado, consolidando o conceito de cesaropapismo no Império Habsburgo. [5]
Reformas na educação e administração da Igreja Católica
Além das mudanças eclesiásticas, José II promoveu a modernização da educação, criando escolas estatais e reduzindo a influência da Igreja nesse setor.
Ele também reformou a administração pública, introduzindo códigos legais mais uniformes e reduzindo privilégios feudais, com o objetivo de aumentar a eficiência e a igualdade perante a lei. [6]
Resistências da Igreja Católica Romana ao josefismo
As reformas josefinas enfrentaram forte resistência de diversos setores. O clero, que perdeu poder e recursos, opôs-se vigorosamente às medidas secularizantes.
Setores conservadores da nobreza e da sociedade, que viam a Igreja como pilar da ordem social, também resistiram às mudanças.
Além disso, a implementação das reformas variava entre as regiões do Império, sendo mais intensa na Áustria e na Boêmia, mas enfrentando obstáculos na Hungria e em outras áreas com forte tradição local.
Após a morte de José II, em 1790, muitas de suas reformas foram revertidas ou suavizadas por seu sucessor, Leopoldo II, devido à pressão popular e política. [7]

Legado do josefismo
O josefismo representou uma tentativa ousada de modernizar o Império Habsburgo sob os ideais iluministas, promovendo a centralização estatal e a secularização.
Embora muitas reformas tenham sido temporárias, elas influenciaram movimentos posteriores de secularismo e modernização na Europa.
O Édito de Tolerância, por exemplo, foi um marco na promoção da liberdade religiosa, enquanto a ênfase na educação estatal pavimentou o caminho para sistemas educacionais mais acessíveis. Contudo, a resistência às reformas também destacou os limites do reformismo iluminista em contextos profundamente tradicionais. [8]
Princípios do josefismo
O josefismo baseava-se em alguns princípios fundamentais que refletiam os ideais iluministas e a visão de José II de um Estado centralizado e eficiente.
Os princípios do josefismo são:
- Supremacia do Estado sobre a Igreja;
- Secularização da administração eclesiástica;
- Tolerância religiosa;
- Educação e utilidade social;
- Soberania nacional.
Supremacia do Estado sobre a Igreja
O princípio central do Josefismo era a subordinação da Igreja às leis e autoridades estatais. José II acreditava que a Igreja deveria limitar-se a questões espirituais, enquanto o Estado controlaria aspectos administrativos, como nomeações de bispos, gestão de propriedades eclesiásticas e aplicação de leis. [9]
Secularização da administração
A administração da Igreja, incluindo a gestão de seminários, paróquias e bens eclesiásticos, foi transferida para o controle estatal. Isso incluía a criação de um clero “funcionário público”, pago pelo Estado e sujeito às suas diretrizes. [10]
Tolerância religiosa
Embora o catolicismo permanecesse a religião oficial, José II promoveu uma tolerância limitada a outras denominações cristãs, como luteranos e calvinistas, e, em menor grau, aos judeus.
Essa política visava integrar minorias religiosas ao Império, mas também reduzir o monopólio da Igreja Católica. [11]

Educação e utilidade social
José II enfatizava a utilidade social das instituições religiosas. Mosteiros contemplativos, considerados “inúteis” por não contribuírem diretamente para a sociedade, foram dissolvidos, e seus recursos foram redirecionados para fins seculares, como a educação pública. [10]
Soberania nacional
O Josefismo rejeitava qualquer interferência externa, especialmente do papado, nos assuntos internos do Império. Isso incluía a supressão de bulas papais e privilégios que contrariassem a autoridade do monarca. [12]
Críticas ao josefismo
O josefismo enfrentou forte oposição, especialmente da Igreja Católica e de teólogos que viam suas reformas como uma afronta à autoridade divina e à tradição eclesiástica.
Nesta seção apresentamos as principais críticas a este movimento teológico do século XVIII.
Ameaça à autoridade papal
A transferência de poderes eclesiásticos do papa para o Estado foi vista como uma violação do princípio de supremacia papal. Teólogos argumentavam que, ao subordinar a Igreja ao Estado, José II desafiava a doutrina católica de que a Igreja era uma instituição divina, independente das autoridades seculares. [13]
O papa Pio VI, em uma visita histórica a Viena em 1782, tentou dissuadir José II de suas reformas, mas não obteve sucesso. [14]
Secularização da fé
Críticos teológicos acusavam o Josefismo de reduzir a religião a uma função utilitária, despojando-a de seu caráter sagrado.
A dissolução de mosteiros contemplativos, por exemplo, foi vista como um ataque à vida espiritual, já que essas instituições eram dedicadas à oração e à contemplação, valores centrais do catolicismo. [15]

Ruptura com a tradição
As reformas josefinas romperam com séculos de tradição em que a Igreja exercia influência significativa na sociedade. Teólogos argumentavam que a subordinação da Igreja ao Estado abria caminho para a secularização e o enfraquecimento da fé cristã nos territórios dos Habsburgos. [13]
Impacto nas comunidades locais
A secularização de bens eclesiásticos e a imposição de um clero estatal geraram descontentamento entre as comunidades locais, que viam a Igreja como uma instituição essencial para sua identidade cultural e espiritual.
Essa resistência foi particularmente forte em regiões rurais da Europa, onde as reformas eram percebidas como imposições de uma elite urbana iluminista. [16]
Aprenda mais
[Vídeo] Teológico | Bíblia & Teologia.
[Vídeo] What Is Josephinism? Europe Through the Ages.
Perguntas comuns
Nesta seção apresentamos as principais perguntas, com suas respectivas respostas, acerca deste termo.
O que significa Josefinismo?
Josefismo é o nome dado à forma de governo idealizada por José II (1741–1790), imperador do Sacro Império Romano-Germânico, que visava submeter a Igreja à autoridade do Estado.
Fontes
[1] Encyclopedia Britannica. (2023). Joseph II, Holy Roman Emperor.
[2] Oxford Reference. (2023). Josephinism.
[3] Encyclopedia.com. (2023). Toleration, Edict of.
[4] Cambridge University Press. (2023). Joseph II.
[5] American Historical Review. (2003). Joseph II and the Limits of Enlightened Absolutism.
[6] Encyclopedia Britannica. (2023). Habsburg Dynasty.
[7] Encyclopedia.com. (2023). Joseph II.
[8] Oxford Handbooks Online. (2023).
[9] Blanning, T. C. W. (1994). Joseph II and Enlightened Despotism. London: Routledge.
[10] Ingrao, Charles W. (2000). The Habsburg Monarchy, 1618–1815. Cambridge: Cambridge University Press.
[11] Beales, Derek. (2009). Joseph II: In the Shadow of Maria Theresa, 1741–1780. Cambridge: Cambridge University Press.
[12] Okey, Robin. (2002). The Habsburg Monarchy: From Enlightenment to Eclipse. New York: St. Martin’s Press.
[13] Van Kley, Dale K. (1996). The Religious Origins of the French Revolution. New Haven: Yale University Press.
[14] Pastor, Ludwig. (1952). The History of the Popes. St. Louis: B. Herder Book Co.
[15] Dickson, P. G. M. (1987). The Financial Revolution in England. London: Macmillan.
[16] Kann, Robert A. (1974). A History of the Habsburg Empire, 1526–1918. Berkeley: University of California Press.
[17] Doyle, W. (2000). Jansenism: Catholic Resistance to Authority. Macmillan.
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