O donatismo, também chamado de donasticismo, foi um movimento de cisma cristão que ocorreu no norte da África no início do século IV, pouco após a conversão do imperador Constantino ao cristianismo em 312 d.C.
O movimento buscava a valorização de uma suposta pureza eclesiástica e sacramental. Além de questionar a legitimidade dos sacerdotes e líderes cristãos norte africanos, que segundo eles, haviam se apostatado da fé por conta do medo da perseguição do imperador romano Diocleciano.
Liderado por Donato, bispo da igreja de Cartago, o donatismo defendia que a validade dos sacramentos, como o batismo, dependia exclusivamente da santidade moral do ministro cristão.
Este apresenta um pouco da história deste movimento, as críticas realizadas contra ele, seu impacto no cristianismo da época e seu legado em diversas seitas heréticas que surgiram na alta Idade Média.
História do donatismo
O donatismo surgiu em um momento de transição do cristianismo, quando a religião passou de perseguida a favorecida pelo Império Romano após o Edito de Milão, promulgado por Constantino e Licínio, que garantiu liberdade religiosa aos cristãos dentro do Império Romano.
O movimento começou na cidade na cidade Cartago em 313 d.C., quando a eleição de Ceciliano como bispo da cidade foi contestada por alguns líderes cristãos da região. [1]
Alguns líderes religiosos questionaram a escolha de Ceciliano como bispo de Cartago, pois ele foi ordenado por Félix de Aptunga. Félix havia sido acusado de ter traído o cristianismo, entregando documentos cristãos para os perseguidores romanos e negando sua fé para evitar castigos físicos. [1]

Influências do novacianismo
O movimento recebeu influências do novacianismo, um cisma cristão que ocorreu no século II. O novacianismo exigia uma pureza rigorosa dos cristãos e rejeitava a reconciliação de cristãos que haviam fraquejado na fé.
Diferente o novacianismo, o donatismo focava na invalidade dos sacramentos administrados por clérigos considerados indignos, promovendo o rebatismo de fiéis batizados por esses bispos.
Essa postura colocava o movimento em oposição à Igreja da época, que defendia a doutrina da ex opere operato, segundo a qual a validade dos sacramentos dependia da graça divina e não da moralidade do ministro. [2]
Condenação pelo Concílio de Arles
Em 314 d.C., o Concílio de Arles, convocado por Constantino, condenou o donatismo, declarando que os sacramentos eram válidos independentemente da conduta do ministro. [1]
A partir de 316, o movimento passou a enfrentar sanções civis, como confisco de propriedades e perda de direitos, embora o Edito de Milão tenha levado a um breve período de tolerância a partir de 321. [1]
Apesar da repressão, o movimento ganhou força, especialmente entre camponeses e classes populares no norte da África, onde se tornou uma força religiosa e social significativa. [1]
Um dos principais pensadores deste período, que a princípio seguia as ideias do movimento, foi Ticônio. Ele foi expulso do movimento por ter ideias consideradas moderadas demais. Ele rejeitava o rebatismo e desenvolveu uma teologia influente, especialmente em sua interpretação do Apocalipse, que impactou até mesmo Agostinho. [2]

Críticas de Agostinho de Hipona
No final do século IV, a oposição ao donatismo se intensificou com Agostinho de Hipona, que escreveu extensivamente contra o movimento.
Em obras como Contra os Donatistas, Agostinho defendeu a unidade da Igreja e a validade dos sacramentos, argumentando que a graça de Deus operava independentemente da santidade do clérigo. [2]
Condenação pelo Concílio de Cartago e declínio do donatismo
O Concílio de Cartago em 411 d.C. reafirmou as críticas de Agostinho e as repreensões feitas pelo Concílio de Arles [3]. A partir disto o donatismo perdeu muito de sua força. Cada vez mais líderes religiosos condenavam suas ideias e práticas.
Apesar disto, o donatismo persistiu em algumas regiões, como a Numídia e a Mauritânia, até o século VII. [1]
A conquista islâmica do norte da África no séculos VII-VIII enfraqueceu o remanescente deste movimento, não havendo mais registro de pensadores do movimento após isto.
Alguns estudiosos sugerem que comunidades donatistas isoladas podem ter sobrevivido por mais algum tempo, mas a falta de registros e documentos invalidam esta hipótese. [1]

Críticas ao donatismo
Devido as suas ideias radicais e seus erros doutrinários, diversas críticas foram levantadas contra o donatismo, expondo seus erros teológicos e até civis.
Nesta seção apresentamos as principais críticas realizadas contra o movimento.
Ameaça à unidade da Igreja
O donatismo foi visto pela Igreja da época como uma ameaça à sua unidade, ameaçando criar divisões e quebrar a ortodoxia.
Os donatistas defendiam a ideia de uma Igreja “pura”, composta exclusivamente por membros moralmente irrepreensíveis, rejeitando sacramentos administrados por líderes considerados “impuros” e pecadores por eles.
As práticas do movimento, em especial o rebatismo de cristãos ordenados pelos líderes “impuros”, foi condenada como herética nos Concílios de Arles e Cartago.
Críticas de Agostinho de Hipona
Agostinho de Hipona foi o principal crítico do donatismo, ele defendia que a santidade da Igreja residia em sua natureza divina, instituída por Cristo, e não na perfeição moral de seus membros.
Em Contra os Donatistas, ele defendia a eficácia objetiva dos sacramentos, como o batismo, independentemente da dignidade do ministro. Para sustentar sua visão, Agostinho citava a parábola do trigo e do joio (Mateus 13:24-30), argumentando que justos e pecadores coexistiriam na Igreja até o juízo final. [3]

Jesus lhes contou outra parábola, dizendo: “O Reino dos céus é como um homem que semeou boa semente em seu campo.
Mas enquanto todos dormiam, veio o seu inimigo e semeou o joio no meio do trigo e se foi. Quando o trigo brotou e formou espigas, o joio também apareceu.
“Os servos do dono do campo dirigiram-se a ele e disseram: ‘O senhor não semeou boa semente em seu campo? Então, de onde veio o joio? ’
” ‘Um inimigo fez isso’, respondeu ele. “Os servos lhe perguntaram: ‘O senhor quer que vamos tirá-lo? ’
“Ele respondeu: ‘Não, porque, ao tirar o joio, vocês poderão arrancar com ele o trigo.
Deixem que cresçam juntos até à colheita. Então direi aos encarregados da colheita: Juntem primeiro o joio e amarrem-no em feixes para ser queimado; depois juntem o trigo e guardem-no no meu celeiro’ “.
Mateus 13:24-30 (NVI)
Críticas de Optato de Milevis
Optato de Milevis, em Contra os Donatistas, também criticava os seguidores do movimento, os acusando de fragmentar a Igreja ao rejeitar sacramentos administrados fora de sua comunidade. Ele também os acusava de promover uma desordem social/civil. [3]
A visão exclusivista do movimento dificultava a reconciliação de cristãos que haviam fraquejado durante perseguições, marginalizando-os e comprometendo a missão universal da Igreja. [2]
Ponderações de Brent Shaw
Brent Shaw, um historiador canadense do século XX, dizia que o donatismo refletia tensões sociais no norte da África, incluindo desigualdades econômicas e resistência à romanização.
No entanto, a rigidez doutrinária dos donatistas é criticada por limitar o diálogo e perpetuar divisões. Alguns veem o movimento como uma forma de proto-nacionalismo africano, enquanto outros o consideram uma expressão de fanatismo religioso. [1]
Seitas que surgiram a partir do donatismo
O donatismo gerou diversas seitas que marcaram a história do cristianismo. Em sua maioria, elas eram dissensões dentro do movimento donatista, grupos que discordavam em um ponto ou outro.
Essas seitas seguiam, principalmente, suas ideias radicais de pureza e negação de autoridade de alguns líderes religiosos.
Dentre as principais seitas fruto deste movimento, estão:
- Rogatistas;
- Claudianistas;
- Urbanistas;
- Maximianistas;
- Circumceliões;
- Igrejas Apostólicas.
Rogatistas
Pacifistas que rejeitavam a violência dos circumceliões e até mesmo dos seguidores mais radicais do movimento, liderados por Rogato, bispo de Cartenna. [2]
Claudianistas
Reconciliados com a Igreja Católica por Primiano, bispo donatista de Cartago, representando uma tentativa de moderação dentro do movimento. [2]
Urbanistas
Uma facção menor, sobre a qual pouco se sabe, mas que indicava divisões regionais no Donatismo. [2]
Maximianistas
Seguidores de Maximiano, que se separaram do Donatismo por discordâncias internas, mas foram parcialmente reintegrados. [1]
Circumceliões
Grupos extremistas que vagavam pelo interior, vivendo entre camponeses e promovendo uma agenda radical. A consideravam o martírio a maior virtude cristã, condenavam a propriedade privada e a escravidão, pregavam o amor livre, o cancelamento de dívidas e a libertação de escravos. [1]
Grupos apostólicos
Pequenos grupos derivados do donatismo que buscavam emular a vida dos apóstolos, mas cujas práticas são pouco documentadas.
Aprenda mais
[Vídeo] O DONATISMO – O CISMA E AS HERESIAS DE DONATO DE CASA NIGRA (História do Cristianismo). A Bíblia toda.
Perguntas comuns
Nesta seção apresentamos as principais perguntas, com suas respectivas respostas, acerca deste movimento do século IV.
O que defendia o donatismo?
O donatismo defendia que a validade dos sacramentos dependia da pureza moral do clérigo que os administrava. Surgido no século IV, na África do Norte, o movimento considerava inválidos os sacramentos realizados por clérigos considerados “traidores” ou moralmente indignos, enfatizando a santidade pessoal.
Quais as consequências do donatismo para a igreja?
O donatismo causou divisões na Igreja, especialmente no Norte da África, criando cismas e conflitos com a Igreja oficial. Enfraqueceu a unidade cristã, desafiou a autoridade eclesiástica e levou a debates teológicos sobre a validade dos sacramentos, sendo condenado como heresia no Concílio de Cartago.
Como se chamam os seguidores do donatismo?
Os seguidores do donatismo são chamados de donatistas.
Fontes
[1] Frend, W. H. C. (1985). The Donatist Church: A Movement of Protest in Roman North Africa. Oxford University Press.
[2] Tilley, M. A. (1997). The Bible in Christian North Africa: The Donatist World. Fortress Press.
[3] Brown, P. (2000). Augustine of Hippo: A Biography. University of California Press.
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