Ascetismo é a prática de renunciar os prazeres físicos e/ou psicológicos, com o objetivo de alcançar a perfeição e o equilíbrio espiritual e moral. Seus praticantes acreditam que é possível alcançar a salvação e perfeição espiritual através da renuncia dos prazeres mundanos/carnais. Dessa forma eles estariam purificando e elevando sua alma, se aproximando mais de Deus.
Este pensamento filosófico não é compatível com os ensinos cristãos, pois se baseia na ideia de que a purificação vem por meio das ações do indivíduo e ignora que a salvação vem somente pela fé em Jesus Cristo. Paulo é claro em determina em Efésio 2:8-9 que somos salvos mediante, exclusivamente, a fé em Cristo e sua obra.
“Porque pela graça sois salvos, por meio da fé; e isto não vem de vós, é dom de Deus. Não vem das obras, para que ninguém se glorie”
Efésios 2:8-9 (ACF)
Heresias com este pensamento surgiram ao longo da história do cristianismo e foram derrubadas em concílios, dentre elas a mais conhecida foi o gnosticismo.
Origem do ascetismo
A origem do ascetismo é incerta, pois se trata de uma prática que existe há muito tempo e em diversas culturas.
Alguns estudiosos acreditam que ele surgiu na Índia, entre os séculos VI e V a.C., com o budismo e o jainismo, que pregam a renúncia aos prazeres materiais como caminho para a libertação espiritual.
Outros estudiosos, no entanto, sugerem que o ascetismo tem origens mais antigas, como no antigo Egito, onde alguns sacerdotes e sábios se dedicavam à meditação e à oração no deserto.
Independentemente de sua origem, o ascetismo é uma prática que se manifesta de diversas formas ao longo da história e prega que a perfeição espiritual só pode ser alcançada através da abstenção dos prazeres.

Ascetismo no cristianismo
Dentro do cristianismo o ascetismo se manifesta como uma prática errônea que se inspira na vida de Jesus Cristo. Ele busca a santidade, ou seja, a união com Deus, através da renúncia aos prazeres e aos apegos materiais. Seu praticantes manifestam essa prática de diversas formas, como, o monasticismo, o martírio, a caridade e as virtudes.
Monasticismo
O monasticismo é um estilo de vida religiosa que se baseia na reclusão e na dedicação à oração e ao trabalho, praticado principalmente na Igreja Católica Romana pelos monges, também chamados de monásticos.
Os monges vivem em mosteiros, onde seguem uma regra de vida que inclui a pobreza, a castidade, a obediência e a oração.

Martírio
O martírio é uma forma de testemunho através da fé até e da morte. Os mártires são pessoas que foram condenadas à morte por suas crenças em Jesus Cristo, que não negaram sua fé e se tornaram exemplos para todos os cristãos.
Caridade
A caridade é a uma forma de expressar o amor cristão ao próximo, através das boas obras aos mais pobres e necessitados. Praticado principalmente pelos católicos, é uma forma de auxílio que beneficia aqueles que padecem de fome e pobreza, porém que pode conduz a uma interpretação incorreta, que a fé cristã se baseia nas ações de caridade.
Virtudes
As chamadas “virtudes” da igreja católica, são práticas morais que visam agradar a Deus. Dentre essas práticas estão:
- Castidade;
- Temperança;
- Humildade;
- Paciência.
Apesar de serem boas práticas de uma cristão, não podemos crer que elas nos tornam justos perante Deus. O texto bíblico é claro em que dizer que fomos justificados pelo sacrifício de Jesus na cruz.
“Vocês foram libertados pelo precioso sangue de Cristo, que era como um cordeiro sem defeito nem mancha.”
1 Pedro 1:19 (NTLH)

Ascetismo em outras religiões
Para todos os seus praticantes, o ascetismo se baseia na ideia de que o mundo material é fonte de pecado e sofrimento, como pensavam a seita herética dos gnosticos. Abaixo listamos como a ideia do ascetismo se manifesta nas principais religiões, não cristãos, do mundo.
Islã
No islamismo, esta filosofia se baseia na submissão a Alá, como sendo o único e verdadeiro deus criador do universo. A ortopraxia mulçumana acredita que ao seguir os cinco pilares do islamismo, eles se aproximam de Alá e alcançam a salvação.
Judaísmo
Embora o judaísmo valorize práticas como o jejum, a disciplina pessoal e a moderação, essas são entendidas como instrumentos de autodomínio e purificação, não como rejeição da criação ou dos prazeres legítimos, interpretado como uma forma de ascetismo.
Os jejuns obrigatórios, como o de Yom Kipur ou o de Tishá BeAv, têm significados históricos e espirituais específicos, mas não se constituem num estilo de vida contínuo de negação do corpo.
A tradição rabínica é crítica em relação ao ascetismo voluntário excessivo. O Talmude da Babilônia relata que o rabino Elazar HaKappar dizia: “Quem jejua é chamado pecador”, refletindo a crítica à autoprivação desnecessária. [11]
A ideia central é que a espiritualidade não está em evitar o mundo, mas em santificá-lo por meio de ações corretas — como o trabalho honesto, a vida familiar e a prática da justiça.

A Torá como base da vida equilibrada
A fonte central da ética judaica é a Torá, composta pelos cinco livros de Moisés, que estabelece as leis e princípios que regem a vida do judeu.
Ela ensina que a vida deve ser vivida com responsabilidade, em relação com Deus, com o próximo e com o mundo criado. Não há uma rejeição da matéria, mas sim a sua elevação por meio do cumprimento dos mandamentos (mitzvot).
O conceito de tikun olam, “consertar o mundo”, reforça a noção de que o judeu é chamado a transformar o mundo positivamente, e não a escapar dele. Portanto, o judaísmo propõe uma espiritualidade encarnada, enraizada na realidade material, mas guiada por princípios éticos e divinos.
Hinduísmo
O hinduísmo baseia na busca pela libertação no ciclo de reencarnações. Os hindus acreditam que, ao renunciar aos prazeres materiais, eles se libertarão do karma e alcançarão a moksha, que é o estado de iluminação suprema.
Na Índia antiga, especialmente a partir do período das Upaniṣadas (c. 800–500 a.C.), desenvolveu-se uma forte tendência à renúncia do mundo material como meio de busca espiritual. [7]
Muitos indivíduos deixavam suas famílias e obrigações sociais para seguir o caminho do ascetismo (tyāga ou sannyāsa), vivendo em florestas ou peregrinando em solidão, dedicando-se à meditação, ao jejum e à mortificação do corpo como meios para alcançar a libertação espiritual (mokṣa). [7]
Esse impulso ascético refletia uma profunda inquietação filosófica com relação ao ciclo de renascimentos (saṃsāra) e o sofrimento inerente à existência.
No entanto, com o tempo, a crescente adesão a esse estilo de vida começou a gerar impactos sociais significativos, como o abandono de deveres familiares e civis por parte de indivíduos ainda em idade produtiva. Essa situação levou os legisladores bramânicos a formularem uma resposta normativa a esse fenômeno.

A doutrina dos Quatro Ashramas
A solução proposta foi o desenvolvimento do conceito dos quatro estágios da vida (āśrama-dharma), um modelo que procurava harmonizar o ideal ascético com as responsabilidades sociais. Esse sistema, descrito nos Dharmaśāstras previa uma progressão ordenada na vida do indivíduo, de acordo com a idade e as funções sociais. [8]
Este modelo segue as seguintes etapas:
- Brahmacarya;
- Gṛhastha;
- Vānaprastha;
- Sannyāsa.
Os sādhus e o ascetismo radical
Dentro desse contexto cultural-religioso, surgiram os sādhus, homens santos que renunciaram à vida mundana e dedicam-se completamente à vida espiritual.
Embora, idealmente, o sannyāsa seja o último estágio da vida, na prática, muitos sādhus iniciam sua renúncia mais cedo, motivados por uma vocação espiritual intensa.
Os sādhus praticam formas variadas e, muitas vezes, extremas de autodisciplina e automortificação, como forma de domar o corpo e purificar a mente. Alguns fazem votos impressionantes como manter um braço erguido por anos, dormir sobre pregos, ou jejuar por longos períodos. [9]
Esses votos são considerados irrevogáveis e parte de uma entrega absoluta à divindade ou a um princípio metafísico. [9]

As práticas variam de acordo com a seita ou tradição. Existem sādhus que seguem Vishnu, Shiva ou Shakti, além de correntes não teístas influenciadas por ideias advaitas (não dualistas). Apesar da diversidade, todos compartilham o compromisso com a renúncia e com a libertação espiritual.
Embora suas ações possam parecer excessivas aos olhos modernos, os sādhus são altamente respeitados na sociedade hindu, vistos como símbolos vivos da renúncia e do desapego. Eles representam a dimensão mais radical da espiritualidade indiana, onde a libertação do ego e das paixões é levada ao extremo. [10]
Budismo
No budismo se baseia na busca pela iluminação através das práticas ensinadas por Buda. Os budistas acreditam que, ao praticar o nobre caminho óctuplo, eles alcançarão o nirvana, que é o estado de libertação do sofrimento humano/mundano.
Sidarta Gautama, conhecido como o Buda, viveu inicialmente cercado de luxo e conforto no palácio de seu pai, onde foi protegido de todas as formas de sofrimento.
No entanto, ao entrar em contato com a realidade da doença, velhice e morte, decidiu abandonar essa vida de privilégios para buscar uma solução definitiva para o sofrimento humano.
Inicialmente, adotou um estilo de vida extremamente ascético, como era comum entre os renunciantes da Índia antiga privando-se de alimento, conforto e até da higiene básica, acreditando que a mortificação do corpo levaria à iluminação espiritual. [3]
Contudo, após anos de práticas rigorosas e quase fatais, Sidarta percebeu que o ascetismo extremo era tão ineficaz quanto a vida de indulgência.

O caminho do meio na prática monástica
A vida monástica budista, conforme descrita no Vinaya Pitaka, texto que compõe o cânone páli do budismo Theravada, busca refletir um equilíbri físico e espiritualo. Monges (bhikkhus) e freiras (bhikkhunīs) são instruídos a manter condições básicas adequadas de saúde, como alimentação suficiente, vestimentas apropriadas, abrigo e cuidados médicos. [4]
Embora vivam com simplicidade, não se espera que se privem a ponto de adoecer tal prática seria considerada contraproducente. [4]
Para eles essa vida não deve ser confundida com ascetismo radical, mas sim vista como uma existência espartana e disciplinada. O objetivo principal é reduzir as distrações materiais para permitir o foco na prática espiritual e na meditação, o que diferencia o estilo de vida budista de outras formas de renúncia extrema. [5]
Práticas do ascetismo no budismo
Apesar da rejeição inicial de Buda a certas práticas ascéticas como dormir em cemitérios ou vestir-se com trapos , algumas delas acabaram sendo incorporadas à tradição monástica em determinadas correntes budistas. [6]
Conhecidas como práticas de Dhutanga (em tailandês, thudong), essas austeridades foram documentadas no Visuddhimagga por Buddhaghosa, e são comuns na Tradição da Floresta da Tailândia, que enfatiza uma vida mais próxima da natureza e com menos recursos materiais. [6]
Etimologia e significado de Ascetismo
A palavra ascetismo tem origem na palavra grega asketikós (ασκητικός), ascético em português, que significa “espiritual”, “místico” ou “contemplativo” [1]. O sufixo “ismo” trás o sentido teórico e filosófico para a palavra. [2]
Com isso ascetismo pode ser definido como “sistema filosófico que busca a alcançar a perfeição espiritual através a abstenção dos prazeres físicos/psicológicos”.
Aprenda mais
[Vídeo] O Asceta e suas práticas. Canal Quero Saber.
[Vídeo] Mensagem 15 – A Cruz ou Ascetismo? | Pedro Dong. Instituto Vida para todos.
Perguntas comuns
Nesta seção apresentamos as principais perguntas, com suas respectivas respostas, acerca deste termo.
O que vem a ser ascetismo?
Ascetismo é um estilo de vida marcado pela renúncia aos prazeres mundanos, adotando a autodisciplina, a pobreza voluntária e a simplicidade como meios de alcançar objetivos espirituais.
O que é ser uma pessoa ascética?
Uma pessoa ascética pode ser entendido como alguém que dedica sua vida à busca de ideais contemplativos, praticando intensa abnegação ou até automortificação por razões religiosas.
O que quer dizer ascetismo na Bíblia?
A Bíblia não fala sobre ascetismo. Entretanto, algumas práticas e conceitos ensinados na Bíblia podem ser similares a um estilo de vida ascética.
Fontes
[1] Ascetico. Infopédia.
[2] Ismo. Dicio.
[3] Rahula, Walpola. O que o Buda ensinou. São Paulo: Cultrix, 2002.
[4] Gethin, Rupert. The Foundations of Buddhism. Oxford University Press, 1998.
[5] Harvey, Peter. An Introduction to Buddhism: Teachings, History and Practices. Cambridge University Press, 2013.
[6] Buddhaghosa. Visuddhimagga (O Caminho da Purificação). Trad. Bhikkhu Ñāṇamoli. BPS, Sri Lanka, 1956.
[7] Olivelle, Patrick. The Āśrama System: The History and Hermeneutics of a Religious Institution. Oxford.
[8] Manusmṛti (As Leis de Manu), trad. Patrick Olivelle. Oxford University Press, 2005.
[9] Parry, Jonathan. “Sacrificial Death and the Necrophagous Ascetic.” In Death and the Regeneration of Life, eds. Bloch & Parry, Cambridge University Press, 1982.
[10] Kinsley, David. Hinduism: A Cultural Perspective. Prentice Hall, 1993.
[11] Talmud Bavli, Taanit 11a.
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