Lázaro

A ressurreição de Lázaro em Betânia, amigo de Jesus, prova o poder de Deus sobre a morte e reafirma Cristo como Messias. Uma lição de fé.

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21 minutos de leitura

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Lázaro de Betânia é uma das figuras mais conhecidas do Novo Testamento. Sua notoriedade não vem de pregações, escritos ou liderança apostólica, mas de um único evento que define sua história: sua ressurreição por Jesus Cristo, quatro dias após sua morte.

Sua história é descrita com detalhes extensos exclusivamente no capítulo 11 do Evangelho de João. Este evento é apresentado como o sétimo “sinal” no Evangelho de João, servindo como uma demonstração do poder de Jesus sobre a própria morte.

Diferente dos Doze Apóstolos, ele não é descrito como um discípulo no sentido formal. Ele não viaja com Jesus nem participa dos grandes debates. Ele é identificado de forma simples como “aquele a quem Jesus amava” (João 11:3).

Neste artigo, apresentamos a história deste personagem bíblico, sua família, a análise teológica de seu milagre, as tradições que se desenvolveram sobre sua vida pós-ressurreição.

Origem e família de Lázaro

Lázaro era natural de Betânia, uma pequena aldeia localizada na encosta oriental do Monte das Oliveiras, a cerca de três quilômetros de Jerusalém (João 11:18).

Sua casa, que ele dividia com suas duas irmãs, Marta e Maria, era um local de refúgio e hospitalidade para Jesus e seus discípulos.

Durante as visitas de Jesus à Judeia, especialmente nas suas idas a Jerusalém, sua casa de oferecia um lugar de amizade e descanso.

A Bíblia não fornece detalhes sobre seus pais, nem se ele era casado ou tinha filhos. O foco do texto sagrado está no relacionamento desse trio de irmãos com o Messias.

A casa de Betânia parece ser um centro de apoio ao ministério de Jesus, onde Ele era recebido não apenas como mestre, mas como um amigo da família.

Ilustração de Lázaro de Betânia
Ilustração de Lázaro de Betânia

Marta, irmã

Marta é frequentemente apresentada como a administradora prática e diligente do lar. Em uma passagem conhecida no Evangelho de Lucas (Lucas 10:38-42), quando Jesus visita a casa, Marta está “preocupada e inquieta com muitas coisas”, focada nos deveres da hospitalidade.

Maria, irmã

Maria é lembrada por dois atos de devoção. O primeiro é sua aparente “inatividade” enquanto ouvia Jesus. O segundo, e mais famoso, ocorre após a ressurreição de Lázaro, durante uma ceia em Betânia (João 12:1-8). Ela pega um frasco de perfume caro, feito de nardo puro, e unge os pés de Jesus, enxugando-os com seus próprios cabelos.

A História de Lázaro: O Sétimo Sinal

O capítulo 11 de João apresenta uma narrativa teologicamente densa. A história de Lázaro é contada não apenas como um evento milagroso, mas como um drama orquestrado por Jesus para revelar Sua glória e identidade.

A doença de Lázaro

De forma abrupta Lázaro adoece gravemente. Suas irmãs, Marta e Maria, enviam uma mensagem urgente a Jesus, que estava pregando do outro lado do rio Jordão, fora do alcance imediato de seus inimigos na Judeia.

A mensagem apela diretamente para a relação pessoal entre eles: “Senhor, eis que está enfermo aquele a quem amas” (João 11:3). Elas não pedem explicitamente que Ele venha; a simples notificação de sua necessidade era, para elas, suficiente.

A ressurreição de Lázaro , por Peter Paul Rubens , 1625
A ressurreição de Lázaro , por Peter Paul Rubens , 1625

O atraso de Jesus

Ao receber a notícia, a reação de Jesus é, à primeira vista, inesperada. Ele declara aos seus discípulos: “Esta enfermidade não é para a morte, mas para a glória de Deus, para que o Filho de Deus seja glorificado por meio dela” (João 11:4).

Em vez de partir imediatamente para Betânia, o texto afirma que Jesus “permaneceu onde estava por mais dois dias” (João 11:6).

Esse atraso deliberado pode ser visto por uns como uma negligência a princípio. Mas Cristo estava atrasando de propósito para que seu amigo viesse a falecer da doença, e com isso pudesse realizar um grande milagre.

A viagem para Betânia

Após os dois dias, Jesus declara a seus discípulos que iriam para Betânia, ou seja, passar pela Judeia.Os discípulos reagem com medo, porque os líderes religiosos em Jerusalém haviam tentado apedrejá-lo (João 11:8).

Cristo responde falando sobre “andar de dia” para não tropeçar. Ele então lhes diz claramente: “Lázaro, nosso amigo, dorme; mas eu vou despertá-lo do sono” (João 11:11).

Este diálogo é interessante, pois os discípulos não compreendem que “dorme” significava que ele havia morrido. Eles compreenderem as palavras de Cristo de forma literal, sendo necessário Jesus declara de forma explícita:

“Lázaro está morto. E eu me alegro por causa de vocês por não ter estado lá, para que vocês creiam. Mas vamos até ele”

João 11:14-15

Nesse momento que Tomé, o Dídimo, demonstra sua fé em Cristo e em sua obra dizendo “Vamos também nós, para morrermos com ele” (João 11:16).

Judeia, Galileia e regiões próximas no tempo de Jesus
Judeia, Galileia e regiões próximas no tempo de Jesus

A morte de Lázaro

Quando Jesus finalmente se aproxima de Betânia, seu amigo já estava no túmulo “havia quatro dias” (João 11:17).

Havia uma crença popular no judaísmo daquela época, registrada no Talmude, de que a alma do falecido permanecia perto do corpo por três dias, na esperança de retornar. No quarto dia, com o início da decomposição visível, a alma partia definitivamente [1].

A chegada de Jesus no quarto dia significava que Ele estava enfrentando a morte em seu estado considerado final e irreversível.

Jesus encontra Marta

Ao saber da chegada de Jesus, Marta correu ao seu encontro. Ela lamentou o atraso de Jesus, dizendo que se Ele estivesse ali, seu irmão não teria morrido, mas afirmou que ainda cria que Deus Lhe concederia qualquer pedido.

Jesus prometeu que Lázaro ressurgiria, o que Marta interpretou como a ressurreição futura, na Glória eterna. Cristão, então explica dizendo: “Eu sou a ressurreição e a vida”. Marta então confessou sua fé, afirmando que Jesus era o Cristo, o Filho de Deus.

O encontro com Maria e o choro de Jesus

Após se encontrar com Marta, Maria correu até Jesus e se prostrou a seus pés repetindo as mesmas palavras da irmã: “Senhor, se tivesses estado aqui, meu irmão não teria morrido”.

A dor de Maria e da família comoveram Jesus , que emocionado chorou pelo sofrimento de seus amigos. (João 11:35).

A ressurreição de Lázaro

Ao chegar ao túmulo de seu amigo, Jesus ordenou que a pedra da entrada fosse removida. Marta e muitos a volta ficam indignados, dizendo que o morto já estava sepultado a 4 dias e o corpo já começava a decompor. Jesus insistiu e removeram a pedra.

Após a remoção da pedra, Cristo orou em voz alta, agradecendo ao Pai para que a multidão presente cresse. Ele clamou: “Lázaro, vem para fora!”. Imediatamente, Lázaro saiu do túmulo, ainda envolto nas faixas (João 11:44).

Lázaro sai da sua tumba por Juan de Flandes (1500)
Lázaro sai da sua tumba por Juan de Flandes (1500)

Lázaro após a ressurreição

A ressurreição de Lázaro não foi o fim da história; foi o começo dos eventos que levaram à Páscoa. O milagre foi público, inegável e polarizador.

A conspiração do Sinédrio

O Evangelho de João relata que, enquanto muitos dos judeus que testemunharam o evento creram em Jesus, outros “foram ter com os fariseus e lhes contaram o que Jesus tinha feito” (João 11:45-46).

O Sinédrio, a suprema corte judaica, foi convocado. O medo deles era político, se sentiram ameaçados pela fama de Cristo.

“Que faremos? Pois este homem opera muitos sinais. Se o deixarmos assim, todos crerão nele; e virão os romanos e nos tirarão tanto o nosso lugar como a nossa nação”

João 11:47-48
Planta do Templo de Salomão com medidas
Planta do Templo de Salomão com medidas

A decisão de matar Jesus

A partir daquele momento Caifás e o Sinédrio decidiram que Jesus deveria ser morto

Alguns estudiosos creem que a decisão foi tomada por medo de alguma ação de Roma contra eles, enquanto outros creem que foi apenas medo de Jesus ameaçar o poder dos líderes religiosos judeus.

A conspiração contra Lázaro

Jesus, sabendo disso, retirou-se da área. Mas Lázaro permaneceu em Betânia, e ele próprio se tornou um problema para as autoridades. Ele era a prova viva do poder messiânico de Jesus.

Quando Jesus retorna a Betânia seis dias antes da Páscoa, a notícia se espalha. Uma grande multidão vai até lá, não apenas para ver Jesus, “mas também para ver Lázaro, a quem ele ressuscitara dentre os mortos” (João 12:9).

O Evangelho de João relata então um desenvolvimento:

“Mas os principais sacerdotes decidiram matar também Lázaro; porque muitos dos judeus, por causa dele, se afastavam e criam em Jesus”

João 12:10-11
Sinédrio, Foto da encyclopedia em 1883
Sinédrio, Foto da encyclopedia em 1883

A última ceia em Betânia

A última aparição de Lázaro na Bíblia é nesta ceia em Betânia, logo após a conspiração para matá-lo. A cena é descrita em João 12:1-8. Uma ceia é oferecida a Jesus. O texto observa: “Marta servia, e Lázaro era um dos que estavam à mesa com ele”.

Esta imagem é significativa, pois o homem que estivera morto e em decomposição, agora está reclinado à mesa, comendo e confraternizando com Jesus.

Lázaro em relatos extrabíblicos e na Tradição

A Bíblia é silenciosa sobre o que aconteceu com Lázaro após a ceia em Betânia. Ele não é mencionado nos Atos dos Apóstolos nem nas Epístolas. Esse silêncio deu origem a um corpo de tradições que floresceram nos séculos seguintes.

Tradição Ortodoxa Oriental

A tradição mais forte e antiga, venerada pela Igreja Ortodoxa, afirma que, após a perseguição que se seguiu ao martírio de Estêvão, Lázaro foi forçado a fugir da Judeia. Ele, junto com suas irmãs, teria viajado para a ilha de Chipre.

Segundo essa tradição, ele foi recebido pelos cristãos locais e mais tarde foi ordenado pelos apóstolos Paulo e Barnabé como o primeiro bispo de Kition (a moderna cidade de Larnaca) [5].

Bispo de Chipre

Ele teria pastoreado a igreja em Chipre por mais trinta anos. Uma lenda famosa ligada a essa tradição diz que, após sua ressurreição, Lázaro nunca mais sorriu, abalado pela visão do submundo que teve durante seus quatro dias morto.

A única exceção registrada ocorreu quando ele viu alguém roubando um pote de barro, ao que ele teria comentado com um sorriso irônico: “o barro rouba o barro” [6].

Após sua “segunda” morte, ele foi enterrado em Kition. No ano de 890 d.C., um túmulo foi descoberto em Larnaca com a inscrição: “Lázaro, o amigo de Cristo”.

As relíquias foram transferidas pelo imperador Leão VI para Constantinopla em 898 d.C., mas o sarcófago original permanece sob o altar da Igreja de São Lázaro, em Larnaca, que é um local de peregrinação [5].

Lázaro , mosaico em Belgrado, Sérvia
Lázaro , mosaico em Belgrado, Sérvia

Tradição ocidental

Uma tradição ocidental diferente, popularizada na Idade Média, especialmente na França, e registrada na “Lenda Áurea” (c. 1260), conta uma história mais dramática [7].

Segundo esta lenda, durante uma perseguição, Lázaro, Marta, Maria (que nesta tradição é confundida com Maria Madalena) e outros cristãos foram colocados à força em um barco sem velas, remos ou leme e lançados ao mar Mediterrâneo.

Em vez de perecer, o barco foi milagrosamente guiado e desembarcou nas costas da Gália (atual França), em um lugar hoje conhecido como Saintes-Maries-de-la-Mer. A partir dali, os irmãos se separaram para evangelizar.

Marta teria ido para Tarascon, onde domou um dragão lendário (o Tarasque), e seu irmão teria viajado para Marselha.

Bispo de Marselha

Em Marselha, ele pregou o evangelho, converteu muitos e se tornou o primeiro bispo da cidade. A tradição conclui que ele foi martirizado ali, decapitado durante as perseguições do imperador Domiciano.

A Catedral de Autun, na Borgonha, foi dedicada a ele e afirmou possuir suas relíquias, rivalizando com as tradições de Marselha [7].

Fachada da Catedra de Marselha
Fachada da Catedra de Marselha

Lázaro em calendários litúrgicos

No Catolicismo Romano, Lázaro é celebrado no Calendário Romano Geral em 29 de julho, em um memorial conjunto com suas irmãs, Maria de Betânia e Marta. Esta data é amplamente partilhada por outras denominações.

Catolicismo caribenho

Historicamente, edições anteriores do Martirológio Romano listavam Lázaro em 17 de dezembro. Esta data mais antiga ainda tem grande relevância cultural em Cuba, onde a celebração de São Lázaro em 17 de dezembro é um dos maiores festivais do país, marcado por uma peregrinação popular a uma capela na vila de El Rincón, perto de Havana.

Luteranismo

A Igreja Luterana também comemora Lázaro, Maria e Marta em 29 de julho em seu Calendário dos Santos.

Anglicanismo

Da mesma forma, províncias da Comunhão Anglicana, como a Igreja da Inglaterra, observam um Festival Menor em 29 de julho para “Maria, Marta e Lázaro, Companheiros de Nosso Senhor”, com leituras e orações próprias.

O túmulo de Lázaro

O suposto túmulo de Lázaro em Betânia é um local de peregrinação até hoje e teve uma história religiosa complexa. Embora as primeiras referências ao túmulo datem de cerca de 330 d.C., a primeira igreja (o Lazarium) foi construída no local entre 333 e 390 d.C.

Essa estrutura foi destruída por um terremoto no século VI e substituída por uma maior, que foi convertida em um convento beneditino durante as Cruzadas (1143). Após a queda de Jerusalém (1187), o local caiu em ruínas.

Uma mesquita simples foi construída ali em 1384, e no século XVI, os otomanos ergueram a Mesquita de al-Uzair, que ocupa o local do túmulo até hoje.

Adjacentes a ela, existem uma Igreja Católica (1955) e uma Igreja Ortodoxa Grega (1965), refletindo a contínua veneração do local por diferentes fés.

Túmulo de Lázaro em al-Eizariya
Túmulo de Lázaro em al-Eizariya

Lázaro em outras religiões

A figura de Lázaro, embora centralmente cristã, ecoou em outras tradições abraâmicas e fés sincréticas.

Santería (Sincretismo)

A confusão entre os dois Lázaros bíblicos se torna central na religião afro-cubana da Santería. O orixá (divindade) Babalú-Ayé foi sincretizado com “São Lázaro” [9]. Babalú-Ayé é o orixá da terra, das doenças infecciosas (como a varíola e a lepra) e da cura.

Quando os escravos africanos foram forçados a adotar a iconografia católica, eles viram a imagem do mendigo Lázaro da parábola de Lucas — coberto de feridas, com cães lambendo suas chagas — e o identificaram com seu próprio Babalú-Ayé.

A figura católica de “São Lázaro” venerada em Cuba (cuja festa, em 17 de dezembro, atrai milhões de peregrinos ao santuário de El Rincón) é, portanto, uma fusão do mendigo da parábola [9].

Islamismo

Lázaro não é mencionado pelo nome no Alcorão. No entanto, o Alcorão afirma que um dos grandes milagres de Jesus (Isa) foi “ressuscitar os mortos com a permissão de Alá” (Surata 5:110).

Comentaristas islâmicos clássicos e coleções de “Histórias dos Profetas” (Qisas al-Anbiya’) identificam um desses homens ressuscitados como al-ʿĀzir (ou ʿUzayr), uma transliteração do nome [8].

Nesses relatos, a história segue de perto a narrativa de João: Isa é um amigo próximo de al-Azir, ele é informado de sua doença, atrasa sua chegada, é recebido pelas irmãs e clama a Alá, que permite que o homem saia do túmulo.

Reunião de peregrinos em Meca. Islamismo, Islã
Reunião de peregrinos em Meca

Legado e referências culturais

Lázaro teve um impacto duradouro na cultura ocidental, tornando-se um símbolo de ressurreição, redenção e o retorno do impossível.

Na Arte

A ressurreição de Lázaro é um dos temas mais retratados na arte religiosa, desde os afrescos nas Catacumbas de Roma.

Caravaggio

A pintura “A Ressurreição de Lázaro” é uma das representações mais famosas.

Em um fundo escuro, Lázaro está sendo levantado, seu corpo ainda rígido pela morte, mas um braço estendido em direção à luz de Cristo, numa pose que alguns historiadores de arte comparam à de Adão na criação de Michelangelo [10].

A Ressurreição de Lázaro, por Caravaggio (c. 1609)
A Ressurreição de Lázaro, por Caravaggio (c. 1609)

Rembrandt (c. 1630)

Este quadro foca na figura de Cristo, que está com a mão erguida na escuridão, seu rosto iluminado pelo poder que Ele está prestes a liberar.

A Ressurreição de Lázaro , Rembrandt . Óleo sobre painel. 96,36 x 81,28 cm (37 1516 x 32 pol.). c. 1630-1632. Museu de Arte do Condado de Los Angeles
A Ressurreição de Lázaro , Rembrandt . Óleo sobre painel. 96,36 x 81,28 cm (37 1516 x 32 pol.). c. 1630-1632. Museu de Arte do Condado de Los Angeles

Vincent van Gogh (1890)

Vincent van Gogh pintou sua própria versão baseada em uma gravura de Rembrandt. Substituindo Cristo por um sol poente, Van Gogh foca na emoção das duas irmãs, Marta e Maria, que se tornam o centro da pintura.

Vincent Van Gogh- La Résurrection de Lazare (d’après Rembrandt)
Vincent Van Gogh- La Résurrection de Lazare (d’après Rembrandt)

O legado de Lázaro é usado na linguagem científica e cotidiana.

Táxon Lázaro (Paleontologia)

Este termo é usado para descrever uma espécie que desaparece do registro fóssil por milhões de anos, sendo considerada extinta, apenas para reaparecer viva em tempos modernos (como o celacanto) [14].

Síndrome de Lázaro (Medicina)

Esta síndrome de refere a um fenômeno médico raro onde um paciente, após falha na ressuscitação cardiopulmonar e declaração de óbito, apresenta um retorno espontâneo da circulação [15].

Sinal de Lázaro (Medicina)

Este sinal é um movimento reflexo (como levantar os braços e cruzá-los no peito) que pode ocorrer em pacientes com morte cerebral [16].

Música e cinema

De David Bowie (em sua canção final, “Lazarus”) ao filme “O Efeito Lázaro” (2015), o nome continua a ser sinônimo do poder de reverter a ordem natural das coisas.

Na literatura

O nome de Lázaro tornou-se uma metáfora para qualquer um que retorna de uma “morte” literal, espiritual ou social.

T.S. Eliot (A Canção de Amor de J. Alfred Prufrock, 1915)

O protagonista do poema, Prufrock, contempla a ideia de retornar de sua morte social para chocar o mundo com uma revelação: “Eu sou Lázaro, vindo dos mortos / Volto para contar tudo, eu contarei tudo…” [12].

Eugene O’Neill (Lazarus Laughed, 1925)

Nesta peça, O’Neill imagina um Lázaro que retorna da morte tendo compreendido que “Não existe morte!”.

Ele só consegue rir, uma risada que liberta seus seguidores do medo, mas que desestabiliza o Império Romano, que é construído sobre o medo da morte [13].

Fiódor Dostoiévski (Crime e Castigo, 1866)

A ressurreição de Lázaro é um tema central do romance. O protagonista assassino, Raskolnikov, espiritualmente morto por seu crime, pede à devota Sônia que leia esta passagem para ele.

A leitura do capítulo 11 de João é o ponto de virada para a “ressurreição” moral e espiritual de Raskolnikov [11].

Retrato de Fiódor Dostoiévski, por Vassilij Grigorovič Perov, 1872
Retrato de Fiódor Dostoiévski, por Vassilij Grigorovič Perov, 1872

O mendigo Lázaro

É importante fazer uma distinção clara entre o homem de Betânia (do Evangelho de João) e o “mendigo Lázaro” (do Evangelho de Lucas). Embora compartilhem o mesmo nome, são personagens completamente diferentes em contextos diferentes.

Mencionado em Lucas 16:19-31, ele é o protagonista pobre de uma parábola contada por Jesus. Ele é um mendigo coberto de chagas que jazia à porta de um homem rico (tradicionalmente chamado Dives, que é a palavra latina para “homem rico”) [3].

Na parábola, ambos morrem. O mendigo é levado pelos anjos para o “seio de Abraão”, enquanto o rico vai para o Hades, um lugar de tormento.

O desespero do homem rico

O homem rico pede a Abraão que envie Lázaro de volta dos mortos para avisar seus irmãos. A resposta de Abraão é o ponto central: “Se não ouvem a Moisés e aos Profetas, tampouco se convencerão, ainda que alguém ressuscite dentre os mortos” (Lucas 16:31).

Suposições teológicas

Muitos teólogos veem uma conexão intencional entre os Evangelhos aqui [4]. Em Lucas, Jesus conta uma parábola onde os líderes religiosos são avisados de que não acreditariam mesmo se um “Lázaro” ressuscitasse dos mortos.

Em João, Jesus de fato ressuscita um homem chamado Lázaro, e os líderes religiosos, exatamente como a parábola previu, não apenas não se convencem, como decidem matar tanto Jesus quanto o homem ressuscitado.

Etimologia e significado de Lázaro

O nome Lázaro é a forma grega (Lazaros) de um nome hebraico muito comum Eleazar (אֶלְעָזָר, Elʻazar). O significado deste nome é diretamente relevante para a história: “Deus ajudou” ou “Deus é meu auxílio” [17].

Aprenda mais

[Vídeo] Teológico | Bíblia & Teologia.

[Vídeo] A ressurreição de Lázaro (João 11). Augustus Nicodemus.

Perguntas comuns

Nesta seção apresentamos as principais perguntas, com suas respectivas respostas, acerca deste personagem bíblico tão relevante para o Novo Testamento.

Quem foi Lázaro na história bíblica?

Lázaro foi um homem de Betânia, irmão de Marta e Maria, e um amigo próximo de Jesus. Ele é conhecido por ter sido ressuscitado por Jesus quatro dias após sua morte, um milagre narrado no Evangelho de João (João 11).

Porque Jesus amava Lázaro?

A Bíblia destaca uma amizade pessoal e íntima, referindo-se a Lázaro como “aquele a quem amas” (João 11:3). A casa dele, Marta e Maria em Betânia era um refúgio de hospitalidade para Jesus durante seu ministério na Judeia.

Porque Jesus chamou Lázaro pelo nome?

O chamado “Lázaro, vem para fora!” (João 11:43) foi um comando direto e pessoal, demonstrando a autoridade de Jesus sobre a morte. Teologicamente, simboliza a natureza íntima da salvação, onde Deus chama cada indivíduo pelo nome para fora da morte.

Porque Jesus mandou tirar a pedra de Lázaro?

Jesus mandou tirar a pedra (João 11:39) para que a multidão participasse do milagre e testemunhasse a realidade da morte (como Marta notou o cheiro). Isso removeu a barreira física, exigindo fé e obediência humana antes da intervenção divina.

Por que Jesus chorou por Lázaro?

Jesus chorou (João 11:35) por empatia. Ele não chorou pela morte de Lázaro (pois sabia que o ressuscitaria), mas se comoveu profundamente com a dor e o luto de Maria, Marta e dos presentes, demonstrando sua plena humanidade.

Porque Jesus esperou 2 dias para ressuscitar Lázaro?

Jesus esperou deliberadamente (João 11:6) para que Lázaro estivesse morto há quatro dias. Naquela cultura, acreditava-se que a morte era irreversível após o terceiro dia. O atraso tornou o milagre inegável, demonstrando o poder de Jesus sobre a morte e glorificando a Deus.

Fontes

[1] Lightfoot, John. A Commentary on the New Testament from the Talmud and Hebraica. Hendrickson Publishers, 1995 (original de 1684). Referenciando tratados como Yevamot 122a e Shabbat 152b sobre a permanência da alma.

[2] Köstenberger, Andreas J. John (Baker Exegetical Commentary on the New Testament). Baker Academic, 2004. pp. 336–337. Analisa o termo enebrimēsato como indignação.

[3] “Dives.” Merriam-Webster.com Dictionary, Merriam-Webster, Acessado em 18 de out. de 2025.

[4] Green, Joel B. The Gospel of Luke (The New International Commentary on the New Testament). Eerdmans, 1997. p. 605. Discute a ironia da parábola em relação à incredulidade dos líderes.

[5] “St. Lazarus, the Friend of Christ.” Igreja Ortodoxa de Chipre. Acessado em 18 de out. de 2025. (Site oficial detalhando a tradição de Kition/Larnaca).

Demais fontes

[6] “The tradition of Lazarus’ smile”. Cyprus Highlights. Acessado em 18 de out. de 2025. (Relatando a lenda folclórica “o barro rouba o barro”).

[7] de Voragine, Jacobus. The Golden Legend (Legenda Aurea). Traduzido por William Granger Ryan. Princeton University Press, 1993. (Compilação medieval da tradição de Marselha).

[8] Wheeler, Brannon M. “Lazarus”. Em Encyclopaedia of the Qur’ān, editado por Jane Dammen McAuliffe. Brill, 2001.

[9] Clark, Mary Ann. Santería: The Religion. Llewellyn Publications, 2007. pp. 78–80. Detalha o sincretismo de Babalú-Ayé com São Lázaro.

[10] Gash, John. “Caravaggio’s ‘Raising of Lazarus’: A Reinterpretation”. The Burlington Magazine, Vol. 132, No. 1044, Mar. 1990, pp. 185–192.

[11] Frank, Joseph. Dostoevsky: A Writer in His Time. Princeton University Press, 2010. pp. 490–492. Analisa a leitura de João 11 em Crime e Castigo.

[12] Eliot, T.S. “The Love Song of J. Alfred Prufrock.” Poetry (revista), 1915.

[13] O’Neill, Eugene. Lazarus Laughed. Boni & Liveright, 1927.

[14] Benton, Michael J. “Lazarus Taxon”. Encyclopædia Britannica, 14 de out. de 2023.

[15] Adhiyaman, Vedam, et al. “The Lazarus phenomenon”. Journal of the Royal Society of Medicine, Vol. 100, No. 12, Dez. 2007, pp. 552–557.

[16] “Lazarus sign”. National Center for Biotechnology Information (NCBI), StatPearls. Acessado em 18 de out. de 2025.

[17] “Lazarus”. Easton’s Bible Dictionary, 1897. (Define a etimologia a partir de Eleazar).

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Diego Pereira do Nascimento
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